domingo, 14 de outubro de 2012

Contos de Pecadinhos - A separação


     


Os dois se distanciaram com o tempo e passaram a não lembrar de tentar esquecer um ao outro. Esqueceram-se mesmo. Ligados a outros compromissos, conhecendo novas pessoas, enfrentando a cada dia novos desafios, deixaram de pensar em tudo o que (não) aconteceu. Já faziam dois meses e ele já estava saindo com novos amigos e conhecendo lugares que nunca tinha ido. Ela já tinha emagrecido quase dois quilos e meio e tinha feito um corte moderno no cabelo; comprou uma moto e decidiu que pegaria a estrada nas próximas férias - logo ela que tinha medo de estrada e não se imaginava um dia sem lavar o cabelo duas vezes. Evitavam ir aos lugares que os dois costumavam ir juntos, evitavam até mesmo a vizinhança do apê que moraram durante 7 anos e que ela continuava vivendo, mas já não frequentava o mercadinho do Seu Horácio - era óbvio demais. Ele agora morava num apê muito menor, com móveis mais modernos - nada rústico que soasse hippie, o faria lembrar dela. Ela passou a não olhar mais pro parque das redondezas nem mesmo se tivesse movimentação, manifesto, performance ou outra atividade qualquer - eles passeavam todos os domingos com o Nestor Aristides - um bulldog de 4 anos, filho do casal. Nenê, apelido carinhoso de Nestor, ficou com o pai e deveria ter direito de ver a mãe que fosse uma vez ao ano, mas eles já não sabiam se essa regra vigoraria. Os dois estavam mesmo muito magoados e de tanto tentar esquecer que se amavam, mesmo estando juntos, deixaram de se amar e seguiram suas vidas. Ela tentava ignorar as besteiras que ele fazia e ele fazia o possível para parecer feliz num casamento que já não existia. Esqueceram-se que amor não é ardente todo dia, que o espaço em um casamento deve ser arejado e seco, para conservar bem e não azedar. Os dois se sufocavam pela falta de afeto, não era liberdade, era descaso. O que eles vivam era pra ser um córrego, com fluidez na corrida da água, mas se tornou enchente e todo o trabalho de manter as coisas em um caminho livre, transbordou. Eles ainda pretendem se encontrar um dia, no subconsciente, quem sabe pra um happy hour e depois sexo tórrido. Ou talvez praquele tradicional passeio no parque com Nenê e depois bodas de ouro.


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